Mais um dia de caos no Hospital Zulmiro Sedósio, nome de antigo, corrupto e incompetente prefeito (que me desculpem a redundância), batismo ideal e apropriado para uma casa pública de serviços de muito duvidosa qualidade.
Encolhido numa desconfortável cadeira de plástico um homem amarelo reclamava baixinho das dores no peito, ao seu lado uma jovem senhora maltratada pelo tempo limpava o nariz de um bebê que teimava em chorar no meio daquela catarrada esverdeada. Jogado a um canto um homem com um buraco na canela por onde se via o branco da tíbia quebrada. A prenha de gêmeos gemia na maca, pernas abertas esperando a hora, como se a natureza fosse esperar os médicos e formulários. A mocinha com conjuntivite, o rapazola hipocondríaco, a velha com a língua solta, o bêbado de cor indefinida e o fígado estufado... Nem num circo de Buñuel existiriam tantos tipos bisonhos.
Escorados no balcão, para protegerem a atendente da agressão de algum descontente, , dois seguranças. Ao lado da porta, outros dois. Médicos não apareciam, apenas uma ou outra enfermeira com seu jaleco branco e sua cara de que as nuvens deslizavam sob seus pés e nada as atingia, superiores às mazelas dos pobres mortais desgraçados espalhados pelo salão. Médicos? Esses devem ter uma entrada secreta, um teletransportador, ou moravam numa cartola, ninguém os via. Na contagem final, eram vistos mais guardas do que médicos ou enfermeiros.
Aquele povo jogado de qualquer jeito pela sala lotada, escura, sem ventilação e recheada de vírus e bactérias até que queria, mas de onde tirar forças para brigar, contestar? Sem falar do medo de depois serem ainda mais maltratados por um doutor vingativo e onipotente.
Muito de vez em quando a atendente chamava por um nome. Se o convocado conseguisse andar ou se arrastar, ia até o balcão de onde era encaminhado por um corredor de azulejos até um dos consultórios. Se não conseguisse se locomover, dois indelicados mastodontes o atiravam sobre a maca ou na cadeira de rodas como se fosse um saco de batatas e os despejava numa daquelas saletas claras e ventiladas.
Num mesmo instante foram chamados a grávida com a bolsa rompida e o homem de perna quebrada. Os mastodontes siameses tiveram que se separar. Um empurrou a maca da mulher, o outro atirou o homem sobre uma cadeira de rodas. Nem gemeu, desmaiou de dor.
Atendidos, operados e internados para a recuperação, a mulher acordou com três pinos de platina na perna e o homem com um curativo cobrindo a cesariana.
segunda-feira, 19 de janeiro de 2009
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